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Editorial: maquiagem que não esconde os 18 da PIRS


Foto: Getty Images

Nem tudo são más notícias no Sistema Penitenciário do Ceará. As experiências exitosas ensaiadas intra muros, volta e meia, tornam-se conhecidas graças aos diferentes canais de comunicação da mídia cearense.


Duas iniciativas bastante positivas da Secretaria da Administração Penitenciária do Ceará (SAP-CE) vieram a público esses dias, devidamente divulgadas também por este portal institucional da Pastoral Carcerária do Ceará. No O POVO (23 fev), a provável implantação no Ceará de presídio que utiliza metodologia mais humanizada da Associação de Proteção e Assistência aos Condenados (Apac); e no Diário do Nordeste (03 mar), a doação de 5 mil livros ao sistema carcerário do Ceará, uma parceria da SAP com a Federação das Indústrias do Estado do Ceará (Fiec).


Parabenizamos a iniciativa da SAP, por meio de seu secretário Mauro Albuquerque. Uma mudança de paradigma na relação com o encarcerado, buscando, ao contrário de uma abordagem violenta, resultados mais positivos em termos de recuperação do indivíduo no pós-presídio. É essa a mentalidade que defendemos e que constatamos nessas duas iniciativas da SAP.


Entretanto, como povo inspirado por Jesus, somos obrigados a fugir das head lines (títulos das notícias) e procurar entender, mais profundamente, o que há por trás desta estratégia da SAP. Afinal, é esta leitura crítica dos fatos que os leitores que acompanham esta Pastoral esperam.


Coincidentemente ou não, essas ações afirmativas da SAP vêm após comprovação, via laudo pericial, que 18 presos da Penitenciária Industrial Regional de Sobral (PIRS) sofreram agressões físicas. A denúncia partiu de profissional da saúde que prestava serviços na PIRS: constataram-se lesões provocadas por ação de policiais penais no dia 20 de janeiro de 2021.


A origem destas lesões, segundo oitivas diretas dos agredidos, está em desatendimento de ordem para término de banho de sol na ALA B, o que ocasionou a intervenção de policiais penais, que reuniram detentos das celas 8 e 9 da referida ALA B em uma única cela, passando a agredir detentos com o uso de cassetetes, especialmente nas mãos, enquanto eram mantidos em procedimento (sentados no chão, voltados para o fundo da cela, encaixados uns nos outros, com os dedos trançados sobre a cabeça). Houve relato, inclusive, de que policiais penais caminharam sobre os corpos dos detentos que ocupavam o chão da cela, não tendo sofrido essa agressão apenas os detentos que permaneceram nas pedras ou comarcas (nome dado pelos internos às camas de concreto). Foram submetidos à perícia 51 detentos, dos quais 18 apresentaram lesões.


Em 19 de fevereiro de 2021, mensagens passadas diretamente pelo Secretário de Administração Penitenciária ao magistrado da 2.ª Vara Criminal ocasionaram nova inspeção de urgência na PIRS. As mensagens indicavam ter sido agredido um interno por outros internos. Ouvido pela administração da PIRS e posteriormente na Delegacia de Polícia Civil, registrou-se depoimento que evidencia linha de defesa dos policiais penais.


De fato, o detento afirmou para a autoridade policial que sofria agressões de outros detentos, e que isso estava acontecendo porque alguns internos teriam intenção de prejudicar os policiais penais, já que teriam conhecimento da existência de investigação sobre os fatos ocorridos no início do ano.


Os autos n.º 8000021-44.2021.8.06.0167 seguem sob sigilo. Na maioria dos eventos dos autos, há sigilo absoluto. A última movimentação data de 24 de fevereiro, sem sigilo absoluto, determinando o juiz que fosse enviado ofício à Polícia Civil para colher informações sobre o andamento do Inquérito Policial, oficiando-se, também, a Controladoria Geral de Disciplina.


Em 23 de fevereiro, a advogada que acompanha a investigação judicial correcional em Sobral esteve na Delegacia de Polícia Civil, por mais de uma hora, tentando acessar a investigação e falar com o delegado responsável, Ozaniel Vasconcelos. No entanto, recebeu informação de que não seria atendida e de que não teria acesso aos autos do inquérito policial.


Desse modo, percebe-se, nas últimas semanas, evidente ação para deslegitimar a investigação, incluir linhas de defesa em favor de policiais penais usando relatos de detentos, desvirtuando a gravidade das agressões ocorridas em janeiro de 2021. A ausência de acesso aos autos da investigação na Polícia Civil lança uma sombra sobre o caso.


Quanto à Controladoria Geral de Disciplina, apesar de reunião ocorrida em 11 de fevereiro no Fórum da Comarca de Sobral, não houve qualquer tomada de posição concreta que tenha sido comunicada no processo, nem mesmo o afastamento preventivo da atual direção da PIRS.


Não por último, citamos as denúncias frequentes veiculadas em determinadas redes sociais de violação dos direitos humanos dos próprios Policias Penais que, por medo de retaliações, ocorridas já tempos atrás, preferem manter o anonimato.


Enquanto a imprensa é alimentada com conteúdos favoráveis à SAP, o modus operandi que nós, Pastoral Carcerária, identificamos como padrão de comportamento da Secretaria de Estado é, infelizmente, ainda hoje, o mesmo que vem sendo aplicado desde o começo de 2019.

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